quinta-feira, 13 de junho de 2013

veja bem



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“Não há nada mais livre do que a imaginação humana.” Essa foi primeira coisa que eu li após o convite de um colega da faculdade para participar de um sarau sobre direito que estavam promovendo. Eu não iria participar, já havia decidido... Enrolei meu colega quando disse que iria pensar. Mas ai veio David Hume e mudou tudo. Uma fagulha despontou em minha mente assim que li o seu escrito e fiquei alguns segundos estática em meu quarto, enxergando coisas no ar. Sentei na cama, peguei meu caderninho, rabisquei alguns elementos que pairavam em minha mente e percebi que havia me enganado a respeito do fato de ter decidido não participar do sarau. A mente da gente é assim, costuma nos enganar vez por outra, ludibriando nossos desejos. Acho muitas vezes que as palavras têm poderes mágicos. Acho isso quase sempre, na verdade. Nas mãos dos bruxos certos, elas tornam-se poções incríveis que nos fazem viajar por mundos em poucos segundos. E foi exatamente isso que aconteceu. Hume me enfeitiçou - maldito! Sentei na cama e comecei a pensar no que poderia fazer de arte no direito. E minha mente iluminou-se com a ideia de que o direito é muito mais do que eu imaginava alguns segundos atrás quando estudava nos livros acadêmicos; o direito não está preso entre as paredes da faculdade, não está somente na lei fria que tira o nosso sono. Ele está no mundo, na nossa relação com o sujeito da porta da frente, com a moça que faz o cafezinho na repartição, nos olhos dos meninos de pés descalços da Praça da Piedade. O direito é vida. Nunca uma frase fez tanto sentido pra mim. Essa ideia me fez pensar que eu poderia falar sobre qualquer coisa que minha imaginação alcançasse, porque o direito está em tudo. Toda essa enxurrada trouxe a mim sentimentos muito profundos e eu pensei que não poderia falar de outra coisa senão o sertão, terra que me enche os olhos quando vê chuva! Pensei no umbuzeiro. Quando a estiagem é muita, ela é uma das poucas árvores que se mantém fértil, assim como homens e mulheres humildes desse nosso sertão. Como diria Euclides da Cunha, o sertanejo é, antes de tudo, um forte. Pude enxergar em minha frente milhares de donas Marias e seus Josés e vi a justiça se transvestir em Nossa Senhora. A fé, certamente, move a vida desses sujeitos como um moinho inefável. E eu pensei no juiz. É ele elo entre o direito e a sociedade e, por isso, precisa ter olhos sensíveis ao mundo em que atua. Faço votos pra que ouçam o clamor de Chaplin – “Juízes, não sois máquinas! Homens é o que sois!”.

10 comentários:

  1. Sensacional! Parabéns!
    Beijos,

    RPF

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  2. Muito legal mesmo!
    Parabéns pela participação!
    Abraços,

    RPF

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  3. Este texto está circulando em fóruns de magistrados.
    Causa espanto em alguns, mas o melhor de tudo é que existem juízes que pensam assim.
    Eu sou um deles!
    Parabéns!!

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  4. Excelente expressão de pensamentos, Fernanda. Só gostaria de te dizer que numa incrível coincidência no momento que lia seu texto começou a chover, o que acabou por dar mais sentido ao sentimento que traduziu em palavras. Aguardamos por mais. Sorriso.
    Vitor

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  5. Muito bom! O modo como escreveu, o sentimento e sua linha de raciocínio são belíssimos!

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  6. A palavra > o motivo > a reflexão > a ação, e novamente palavra, motivo, reflexão, ação... um círculo maravilhoso a girar a roda da vida! Linda ponte entre o texto, a ilustração e a profissão.

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